O “cheiro de mel que o vento traz”, como canta Alcymar Monteiro em “Verdes Canaviais”, diminuiu na última década. Apenas cinco engenhos mantêm a produção de cana-de-açúcar neste Município do Cariri cearense. Dois fabricando apenas rapadura, e três que, além do doce, fazem a cachaça, batida e alfenim. Todos trabalhando somente por encomenda.
A tradição da cana-de-açúcar diminuiu muito em Barbalha, que, até a década de 1960, possuiu cerca de 100 engenhos. Mas este grande número vem desde o período colonial, quando iniciou a produção no Cariri motivada pela quantidade de água encontrada nas fontes da região. Por meio de valas, ela deslizava em direção aos canaviais, molhando as áreas de baixio. Este sistema também era utilizado na policultura, produzindo arroz, milho e mamona.
Os primeiros engenhos instalados na região eram de madeira e dominaram o setor até o século XVIII, quando foram substituídos pelos engenhos de ferro, movidos por força hidráulica ou animal. Pela dependência da propriedade dispor de água, a moenda movimentada por bovinos ganhou mais difusão no Cariri.
Entre 2002 e 2012, 13 engenhos fecharam as portas em Barbalha. A maioria era herança de pai ou avô, produtor de rapadura. Todos com mais de 10 anos de funcionamento. É o caso Jorge Garcia, que cuidou do engenho de seu avô, José de Sá Barreto Garcia, depois que ele faleceu, seguindo os costumes da família e fabricando o produto no Sítio Bulandeira. Porém, em 2011, ele largou a cana-de-açúcar.
“Fui um dos maiores produtores de rapadura de Barbalha. Larguei porque o comércio diminuiu muito. Também tinha uma perseguição muito grande dessas leis, sem nós termos condições de pagar as custas que o Governo exigia. O pessoal diminuiu muito o consumo de rapadura. Na época do algodão, saía muito, porque tinha muito operário comendo”, lembra.
A economista Denize Paixão, que pesquisou a produção na primeira década de 2000, acredita que a decadência dos engenhos está associada, principalmente, à dificuldade de comercialização, baixa lucratividade, evasão de mão de obra, falta de recursos, além das exigências do Ministério do Trabalho de regularização do pessoal ocupado, melhoramento nas unidades produtivas, de condições de trabalho e higiene do produto.
Hoje, os cinco engenhos, quase que vizinhos, localizados na entrada da cidade, só funcionam dois dias na semana. A maior parte do movimento acontece na época das romarias, na cidade vizinha, Juazeiro do Norte. Muitos visitantes vão até as fábricas de rapadura e compram, inclusive cachaças e doces fabricados de outras cidades.
A estrutura do engenho de cana-de-açúcar se mantém, apesar do equipamento ter se deteriorado com o tempo, como o trator e o caminhão que deixava a carga dos produtos. “Está tudo aí, se quiser moer cana amanhã, eu vou moer. Tá tudo do mesmo jeitinho”, garante Jorge.
No auge da rapadura, comprou carro e fez sua casa. Com nostalgia, lembra todo o processo de produção do doce. “Moía a cana, extraia o caldo, a ‘garapa’, depois saía para as caldeiras, que levava fogo, aí fazia o processo até o mel ‘cachear’, mexendo na gamela, para depois levar para as formas”, conta.
Com a queda da rapadura, Jorge Garcia resolveu plantar banana, uma cultura que vem ficando cada vez mais comum no Cariri. “Planto para a terra não ficar ociosa. São duas tarefas só para entreter”, brinca. Da época em que trabalhava com até 50 pessoas, hoje o agricultor faz tudo sozinho e vende a fruta para pequenos comerciantes locais, que compram na porta do sítio.
Usina abandonada
A dez quilômetros dali, na Usina Manoel Costa Filho, na saída de Barbalha para Missão Velha, na beira da CE-293, a paisagem foi ocupada por bananeiras há quatro anos. O equipamento, adquirido pelo Governo do Estado em 2013, por R$ 15,4 milhões, ainda não foi reativado e sequer há alguma expectativa de voltar a produzir açúcar ou etanol. Criado em 1973, o prédio está desativado há mais de uma década.
A área em volta da Usina, com 65 hectares, foi comprada pelo empresário João Landim. Segundo ele, o terreno estava penhorado pelo Banco Industrial e Comercial, e resolveu ampliar a plantação de bananas que três anos antes começou no distrito de Missão Nova, em Missão Velha. Sua empresa, a Paraíso Verde, produz em cerca de 500 hectares nos dois municípios. “Como meus pais eram agricultores e sempre gostei, resolvi apostar. Mas não via nada que fosse viável. Conversando com amigos, indicaram a banana como bom negócio”, explica.
Dificuldades
No início, teve dificuldades para escoar os produtos, batendo de porta em porta nos supermercados. “Teve supermercados que fomos 20 vezes oferecer. A gente não tinha essa credibilidade, mas, aos poucos, fomos conseguindo, a quantidade aumentando. Hoje, estamos vendendo 80% para supermercados. Alguns vieram visitar e começaram a comprar”, completa.
A banana plantada no Cariri é vendida em várias partes do Nordeste, mas tem quatro núcleos de distribuição: Teresina (PI), Fortaleza (CE), Salvador (BA) e São Luís (MA). Em 2009, 60 funcionários deram início à Paraíso Verde, que hoje emprega 350 pessoas. A cidade de Missão Velha, por exemplo, é a oitava maior produtora de banana do Brasil com 2,8 mil hectares de plantação e quase 90 mil toneladas da fruta colhidas por ano.
Adaptação
No entanto, o agrônomo Camilo Cabral explica que o solo na região não é ideal para a banana, que aumenta o custo da produção em relação a algumas áreas que também produzem o fruto no Brasil.
“São predominantemente ácidos e bastante arenosos. Como tem sistema de irrigação, faz alteração do solo e adiciona matéria orgânica. A gente também faz as coletas de solo para fazer análises e recomenda algumas correções para elevar o nutriente para a planta”, afirma.
Por outro lado, a região é favorecida para a fruticultura por chover acima da média em relação a outras regiões do Estado, além de possuir muita água no aquífero, acessada por meio de poços profundos.
“A produção da fruticultura tem diminuído em alguns estados por falta de água. Com isso, as empresas têm migrado de outras regiões do Ceará, algumas fechando as portas ou diminuindo a área plantada, enquanto o Cariri está se destacando”, acredita o agrônomo.